terça-feira, 10 de dezembro de 2013

o pensamento é um animal selvagem










<<Vejo o melhor e aprovo-o, mas faço o pior>> [Ovídio, Metamorfoses, VII, 20, ss.] O mesmo parece ter pensado também o Eclsiastes [I, 18.], quando disse: <<Quem aumenta a ciência, aumenta a dor>>. Não digo isto com o fim de concluir daí que vale mais ignorar do que saber, ou que não há nenhuma diferença entre o tolo e o inteligente no que diz respeito ao governo de suas afecções, mas, sim, porque é necessário conhecer tanto a potência como a impotência da nossa natureza, para podermos determinar o que pode a Razão no governo das afecções e o que não pode.

(Espinosa / Spinoza, Ética IV, Proposição XVII, Escólio)


...a razão, o saber, a ciência, o conhecimento, não pode determinar tudo, não pode conhecer tudo, não pode governar tudo. Há algo no corpo, na Natureza, que lhe escapa. Mas para que de <uma certa maneira> ela determine, conheça, governe, ela precisa passar, atravessar, conviver com o bem e com o mal. Conhecer, ter ciência, raciocinar, saber o que pode a Razão, o pensamento, saber o que lhe cabe, comporta na sua própria capacidade, é preciso percorrer os extremos, vivência-los, experimenta-los. Só se sabe o que se pode - saber só é poder - em relação a si mesmo, ao corpo, à sua própria Natureza na medida em que mergulha-se em toda sua inteireza, sua amplitude, sua exuberância e miséria, seu vicejo e despejo, esplendor e crepúsculo: <é>-se toda ela...






Não se muda a vida trocando a vida real por um ideal abstrato, por uma norma posta acima dos indivíduos ou por um modelo ao qual o homem deveria se conformar. A razão não pode ensinar nada que esteja contra a natureza.

(Espinosa, Ética IV, Proposição XVIII)


...e nada está contra sua natureza...








Jogando com sua má vontade e com seu mau humor, com esse exercício perverso e esse teatro, o pensamento aguarda uma saída: a brusca diferença do caleidoscópio, os signos que por um instante se iluminam, a face dos dados lançados, a sorte de uma outra rodada. Pensar não consola, nem torna feliz. Pensar se arrasta languidamente como uma perversão; pensar se repete diligentemente em um teatro; pensar se joga em um lance fora do copo de dados. E, quando o acaso, o teatro e a perversão entram em ressonância, quando o acaso quer que haja entre os três uma tal ressonância, então o pensamento é um transe; e vale a pena pensar.

(Foucault, Theatrum Philosophicum)



corpo-pensamento

pensamento-corpo


uma natureza que se fez








sim, o que pode o corpo, e, sim, o que pode o pensamento?